quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Contos de Altamir #33

Ano dez – Grande Arena de Agni

Akutenshi virou-se para Levi e notou que a figura encapuzada falava ao ouvido do Conselheiro, com a mão em seu ombro, como faz um filho com seu pai. O barulho parou e imediatamente sua atenção voltou-se a arena. Nesse momento, Enric havia se afastado em direção ao alto, flutuando a cinco metros de altura.

Felipo o olhava com toda voracidade de seu coração e Enric retribuía o olhar com o mesmo instinto de coragem intrépida. Ambos sabiam o que deveria ser feito. Dizem os contos antigos que dois grandes guerreiros conhecem o coração um do outro enquanto lutam. Ali estavam não apenas dois grandes guerreiros, mas sem dúvida, os mais poderosos de Agni, quiçá de todo Altamir.

O Salamandra girou sua espada girante na frente do corpo, e encravou-a no chão. Fez alguns movimentos com as duas mãos e as colocou juntas em frente ao rosto com os dedos entrelaçados, enquanto Enric, ainda suspenso no ar uniu lentamente a palma das duas mãos na frente do tronco. E enquanto o fazia, uma espécie de esfera se formou entre suas mãos. O negro fechou uma mão na outra e a esfera foi consumida pelo seu corpo draconiano. Ao seu redor surgiam esferas vermelhas de energia semelhantes a que tinha a pouco em suas mãos, enquanto no chão se via um homem avermelhado envolto por uma aura negra e densa, que fazia vibrar o chão ao seu redor e quicar as pequenas pedras soltas.

Todas as esferas ao redor de Enric se uniram ao seu corpo se súbito quando ele inflou os pulmões penetrando em sua pele como água em uma esponja seca. Toda aquela aura vermelha foi engolida por Felipo em um suspiro profundo de boca aberta.

O dragão fitou a Salamandra que já o tinha como alvo.

Nessa fração de segundo, uma daquelas bolhas translucidas de energia surgiu em volta deles, e logo em seguida, mais duas. Dessa vez, era menor, alcançando apenas os dois guerreiros, perfeitamente esféricas e triplamente resistentes. Poucos ali presentes saberiam dizer de onde, porque e como surgiram, mas todos deveriam estar agradecidos por elas estarem ali naquele momento, do contrario, o que era um grande evento, se tornaria uma tragédia.

Labaredas de fogo negro subiram e de fogo escarlate desceram saídas das monstruosas bocas de Salamandra e Dragão. As esferas de energia, em poucos segundos, se tornaram um recipiente mortal de fogo rubro escurecido, resultado da fusão daquelas energias totalmente destrutivas.

Os mais atentos puderam ver que duas das esferas simplesmente desapareceram, provavelmente não resistiram, e mais quatro surgiram antes que a ultima se rompesse. E novamente, mais três delas foram destruídas, restando por fim, apenas duas.

O interior das esferas manteve-se queimando durante alguns minutos, e a tensão nos espectadores era clara.

As duas ultimas esferas de contenção se dissiparam, quando já era visível a dispersão do fogo no interior. Ainda havia chamas flutuando no ar, como se não precisassem de combustível para se manter acesas (pareciam ter vida própria), mas já era possível ver duas figuras no chão, ambos com feições totalmente humanas.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Contos de Altamir #32

Ano dez – Grande Arena de Agni

A multidão fora e dentro da arena silenciou, os conselheiros sussurravam entre si, akutenshi -que já havia retornado ao camarote - estava apreensivo e outra figura que acabara de chegar ao camarote real pôs a mão no ombro de Levi, o único conselheiro que mantinha a sobriedade. Totalmente coberta por um capuz, era impossível ver o rosto e corpo daquela pessoa, apenas podia-se afirmar que não era, ou pelo menos, que não tinha estatura de um adulto.

O Rei do norte se levantou, debruçou-se sobre a borda do camarote e fitou a menina que já olhava para trás, como se esperasse essa reação dele. Ele tinha um olhar questionador e ela um sorriso tranqüilo. Ela olhou novamente pro centro da arena.

-Alicia o q... – disse Akutenshi, e ao mesmo tempo ouviu-se um barulho intenso.

Um rugido extremamente grave, que fez arrepiar até o grande Rei do norte. Seguido de uma gargalhada macabra. Akutenshi olhou perplexo para aquela nuvem densa de fumaça e poeira no centro da arena, onde ele achava que jazia um homem derrotado, e de onde acabara de ouvir aqueles sons monstruosos.

Antes mesmo que a nuvem se dispersasse viu-se algo sair voando de lá. Com a velocidade incomparável ele voou até cerca de vinte metros de altura e parou no ar, como se pudesse controlar a gravidade e todos puderam vê-lo.

Era uma figura negra, com o tronco nu. De seu dorso saiam duas asas gigantes, também negras, robustas e escamadas. Tinha o lado direito de seu peito sangrando, assim como o braço esquerdo, que parecia deslocado. Seus olhos eram de um vermelho escarlate intenso e em seu rosto havia uma expressão de extrema excitação.

-Deixe-me contar uma coisa... – disse a figura humanóide alada olhando para seu oponente – eu não sou canhoto.

E com isso, Enric, o quinto de seu nom, o Dragão Negro, desceu em disparada, num assalto esmagador. Nas arquibancadas e nos camarotes, não havia nenhum pingo de fôlego. Até os conselheiros que a pouco conversavam entre si, pararam para prestar total atenção no momento único.

Felipo estava próximo ao centro da arena naquele momento - Após seu ultimo golpe, teve tempos suficiente para ir andando até lá, onde acreditava, ouviria dos conselheiros que havia ganhado a luta – em seu lugar, qualquer um temeria a morte. Independentemente, de suas experiências anteriores em lutas, não havia ali ninguém que já tivesse visto tamanha emanação de poder. Apesar de haver ali um ou outro que presenciou Kamael em suas batalhas, ninguém era nascido na época das grandes batalhas, onde Altamir Gilgamesh lutou contra animais sagrados e os derrotou sozinho na sua maioria. No entanto, ali estava o homem – ou seja lá o que – mais preparado para aquele momento.

Felipo se pôs em posição de defesa e esperou o golpe. A emanação de poder do dragão era tamanha, que podiam ver seu rastro de fumaça no ar. Do outro lado, o Salamandra por baixo de sua armadura negra, havia se tornado totalmente vermelho, com exceção de seu rosto e pescoço, que mantinha a cor morena.

No ultimo instante precedente ao golpe, uma barreira mágica se estendeu sobre toda a circunferência irregular na arena. Um campo translucido, que se assemelhava a uma bolha de sabão em sua aparência frágil, mas que, no entanto, salvaria a todos ali presentes do que estava por vir.

Lamina contra Lamina.

Machado contra espada.

No primeiro momento, nenhum barulho se ouviu, um intervalo de um segundo em silencio absoluto. Em seguida a extrema pressão sonora causada pelo impacto. Ainda estavam ali, parados os dois, com suas armas a se tocarem.

No terceiro segundo, o machado gigante rachou e no que o precedeu, toda a armadura de Felipo caiu estraçalhada, deixando-o apenas com sua calça e cota de malha, que lhe cobria o tronco.

O barulho ainda era intenso. Foi no quinto segundo que a bolha estourou e parte da mureta de proteção da arena veio a baixo, em vários pontos.

domingo, 11 de setembro de 2011

Contos de Altamir #31

Ano dez – Grande Arena de Agni

-Pode me deixar aqui – disse Romeu – quero assistir a essa luta.

Felipo deixou Romeu sentado ao lado da porta, no chão. Virou-se e retornou ao centro da arena, vindo na direção oposta que Enric. Akutenshi não estava mais no centro da arena, saiu pela mesma porta que Lara, passando pelo lado de Enric, sem que este lhe prestasse atenção.
Chegaram quase ao mesmo tempo ao centro da arena:

-Que comece a segunda semifinal! – exclamou Levi. E não perderam tempo.

Felipo partiu pra cima, com sua espada gigante. Uma lamina negra sem brilho, que tinha um metro e meio de tamanho por vinte centímetros de largura. Com apenas um gume e punho de quarenta centímetros, ou mais. A espada negra tinha perto da extremidade da lamina, um ângulo até a ponta, na parte sem fio, havia uma concavidade em forma de semicírculo que parecia amolada, e perto do punho, no centro da folha, um circulo vazado.

Um homem grande, quase dois metros de altura, de porte robusto, pele pouco mais clara que a da Enric e cabelo igualmente escuro e curto, correu rapidamente e em linha reta o pequeno percurso e golpeou horizontalmente. Enric ainda estava atinado quando recebeu o golpe, defendendo-o com seu machado. O barulho do encontro daquelas duas armas causou um grande estrondo. Um barulho agudo de metais se chocando, seguido de um grave, referente à colisão daquelas massas de energia.

Os pés de Enric quase se desprenderam do solo, foi arrastado por alguns centímetros para o lado. Ele segurava a arma com as duas mãos e com bastante esforço manteve-se firme. Dali não havia maneira de contra-golpear, então tudo que pode fazer, foi empurrar seu adversário usando o peso de seu corpo. Felipo aproveitou o impulso e parou a dois metros.

-Muito forte... – disse Enric, e respirou fundo.

-Você ainda não viu nada – disse o outro. Enric estava revestido por uma armadura negra completa com detalhes vermelhos. Apenas os pés e as mãos não tinham parte na indumentária metálica. Em sua cabeça, um capacete negro reluzente com detalhes em vermelho, era a peça mais notável de sua armadura. Sem visor, apenas com um protetor na direção do nariz, um desenho em relevo nas laterais que lembrava a pele de um réptil e uma silhueta superior que fazia parecer uma espécie dantesca de lagarto.

Felipo foi pra cima novamente, mas dessa vez Enric também partiu, e ao mesmo tempo aquelas grandes armas se chocaram a curta distancia. Novamente houve aquele barulho.

Monstros... -Levi se arrepiou ao pensar que naquele lugar eles estavam totalmente vulneráveis a todo aquele poder.

Os choques se seguiram repetidamente, e em cada um, o impacto trazia um barulho intenso.

-Quando você vai começar a lutar de verdade? – disse Felipo no intervalo de um golpe.

-Assim que você me mostrar do que é capaz – respondeu o outro.

-Eu já ouvi isso antes, e o resultado não Foi nada bom – Felipo saltava para traz novamente, pelo impacto de um golpe de Enric. Colocou os pés no chão enquanto freava sua trajetória. Ao parar totalmente ele deixou-se cair pra frente, tocando a mão esquerda no solo e posicionando a direita, que empunhava a espada gigante, para traz – Salamandra – disse num idioma semelhante ao comum, mas com um sotaque arrastado, que soava como "Sialamandga". Seus olhos se tornaram totalmente negros e a mão que tocava o solo, avermelhada. Estava numa posição animalesca e Enric parecia realmente impressionado.

Num impulso utilizando os três membros que tocavam o solo, Felipo disparou e golpeou seu adversário com uma força incrível. Tamanha que Enric, mesmo defendendo o golpe, foi atirado contra o muro da arquibancada, destruindo uma parte daquela proteção.

Uma densa massa de poeira se formou e de dento dela saiu Enric em um salto. No entanto, ao ganhar alguma altitude foi atacado novamente por um golpe por trás. Um soco com as duas mãos, que o jogou como uma flecha contra o chão, criando ali um segundo buraco na arena.

E como se não fosse bastante, Felipo ainda no ar fez com a mão esquerda alguns gestos rapidamente, algo como a invocação de uma magia. Retirou o capacete, respirou profundamente e no local onde estava Enric, cuspiu fogo. O fogo negro desceu como uma rajada enfurecida em direção ao buraco que se encontrava o outro.

domingo, 4 de setembro de 2011

Contos de Altamir #30

Ano dez – Grande Arena de Agni

Felipo Vuur, que ainda estava dento da arena, caminhou devagar até o centro, onde estavam os lutadores. Chegou ao lado de Romeu, segurou o braço dele e pôs por cima do seu ombro.

-Lutou bem, meu amigo – disse Felipo. A multidão estava em silencio absoluto.

-É a primeira vez que você foi amistoso comigo – respondeu Romeu antes de deixar seu peso cair sobre o ombro do outro.

-Eu respeito um grande guerreiro quando eu reconheço um – disse ele voz baixa - A vitória é da moça! – gritou logo em seguida.

-É justo – sussurrou o outro sorrindo.

Lara encolheu o braço lentamente, levando-o ao tronco. Pôs a mão direita contra o solo pressionando para forçar seu corpo a se levantar. Não se ouvia nenhuma voz vinda das arquibancadas. Ela conseguiu dolorosamente colocar-se de joelhos, ainda com a espada em mãos. Ergueu a mão direita com a espada empunhada, e encravou no solo, servindo-lhe de apoio para levantar-se. Lentamente, ergueu totalmente o corpo.

Ela estava a menos de um metro de distancia dos outros dois ali presentes. Ajustou sua postura, mesmo ainda cambaleante pôs-se em posição de ataque, com sua espada na frente do corpo.

A multidão aplaudiu ao ver o grande esforço da moça pra continuar sua luta. Akutenshi pulou do camarote onde estava, descendo surpreendentemente no meio da arena, tocando o chão argiloso com leveza. Segurou os pulsos da moça com a mão esquerda:

-Tudo bem, pode descansar agora - Lara abaixou a espada e caiu nos braços dele.

Da porta da arena, Enric assistia a cena. Romeu, ensangüentado e sendo carregado por Felipo, Lara, nos braços de Akutenshi, provavelmente sairia dali carregada, e o seu oponente também saíra dali da mesma forma. Nas duas lutas anteriores, o vencido saiu totalmente desgastado. Mas naquela, ambos estavam totalmente mortiços.

Enric sabia que Romeu era um grande guerreiro. Certa vez, quando foi à Varuna, o viu lutar, e ficou impressionado com seu poder. Ele acreditava que Lara poderia ser derrotada, e então lutaria contra Romeu na final, após derrotar Agamenon e Felipo – pois já acreditava em suas vitórias, antes mesmo do início das lutas. No entanto, não esperava que esse revés fosse possível. Agora, segundo a estimativa dele, seria obrigado a lutar contra Lara. Logo agora que desenvolvia um afeto por ela.

Lara desvencilhou-se dos braços de Akutenshi visivelmente cansada. Num movimento único, embainhou a espada e virou-se lentamente para a saída da arena. Andou quase mancando até a porta que Enric estava:

-Não esperava tanto de você – disse ele.
Ela parou ao lado dele.

-Verá muito mais na final – fez uma pausa com a respiração cortada – se não se matar até lá.
Ela percebeu - pensou ele.

Impressionado com a capacidade de percepção dela, ficou sem palavras. Em um momento na luta de Enric, ele cometeu um grande erro. Deixou que seu adversário chegasse ao seu ponto cego e o atingisse.

O que todos viram foi que o Alvo tinha executado um movimento veloz e com muita precisão. Contudo, o que aconteceu realmente não foi em momento nenhum mérito de Agamenon, mas um descaso do seu oponente. No momento que seu adversário estava atrás de si, Enric se virou numa velocidade incrível, imperceptível aos olhos destreinados. Poderia então, acabar com a luta naquele instante. Mas, apesar de sua posição privilegiada e seus movimentos mais rápidos do que o de seu adversário, Enric escolheu virar-se novamente de costas e receber o golpe.

Enquanto isso, Felipo Vurr saia pelo outro extremo da arena carregando Romeu.

-Então você é o Tritão... – disse ele, e Romeu retribuiu apenas um sorriso maroto – e Enric é o dragão.

-Isso mais está parecendo uma batalha de animais contra pessoas – sorriu debochado.

-Acho que a próxima luta será entre dois animais – disse Felipo.
Romeu desfez o sorriso do rosto.

sábado, 3 de setembro de 2011

Contos de Altamir #29

Ano dez – Grande Arena de Agni
Romeu empunhou sua espada com as duas mãos na frente do corpo e Lara fez o mesmo. Ele sabia que aquela era a especialidade dela, o Kendo. Estavam a três metros um do outro. E mesmo àquela distancia, ambos podiam sentir a emanação de poder do adversário. Provavelmente, ali estavam os mais poderosos guerreiros de Varuna.

Lara fechou os olhos em sinal de extrema concentração. Abriu-os novamente e se deparou com duas mudanças repentinas que lhe impressionaram, tirando um pouco o foco de sua concentração.

A espada de seu adversário cresceu, estava agora muito maior que a sua, chegando a um metro e meio e mantendo ainda a mesma espessura. Mas o que mais lhe impressionou, aconteceu com sua própria arma. Ela podia sentir uma vibração na lamina da Katana. Uma força parecia querer sair da arma, o oposto do que foi acostumada a fazer.

Em seus treinamentos, Lara foi ensinada a por seu poder na arma. Mas nesse momento a espada parecia ter poder próprio, ela sentia que havia algo de especial na arma e sabia que poderia usar essa habilidade.

Com os olhos fixos na lamina, ela se recompôs, flexionando perfeitamente o corpo para se por na postura perfeita que lhe era característica. Concentrou toda sua vontade e desejo de vitoria naquele momento e deixou-se ser invadida pela emanação da arma.

- Mizuken... – disse ela. Esse era o primeiro nome cravado na espada. E as outras palavras fluíram de sua boca – Nagareru Furi! – quando terminou de falar ao seu redor surgiu uma aura espectral de cor azulada.

No chão, ao redor dela, se formou um circulo de luz, rodeado de palavras e símbolos de varias linguagens, épocas e lugares diferentes. Os símbolos se desprendiam do chão como centelhas de uma fogueira, enquanto novos apareciam e seguiam o mesmo caminho até chegar ao corpo da moça. Naquele momento a platéia se admirava com o encanto daquela habilidade, enquanto o não tão impressionado, Romeu, também concentrava em sua espada o trunfo que poderia lhe trazer a vitória.

O rosto dele havia mudado, escamas apareceram perto de suas orelhas, e em sua testa surgiram marcas. Do símbolo azul semelhante a um tridente no centro da testa, saiam duas linhas retas na horizontal, que chegavam ao cabelo. Marcas azuis escuro surgiram em seus antebraços, linhas grossas que pareciam ter sido desenhadas aleatoriamente, algumas chegavam até seu pulso.
Ele sibilou algumas palavras enquanto a aura que envolvia Lara explodiu se transformando em pura energia, formou uma esfera de luz ao redor de si e depois se contraiu em seu corpo.
Partiram de encontro ao mesmo tempo, num único impulso. E ao se chocarem uma grande explosão aconteceu, causando uma cratera no centro da arena. Em seguida uma grande e densa coluna de poeira se ergueu e ninguém pôde ver o que tinha acontecido ali por alguns instantes.
Inquietos e curiosos, os espectadores sussurravam nas arquibancadas enquanto todos no camarote central permaneciam em silencio, impressionados. Enquanto a nuvem de poeira se dispersava, Levi se levantou.

Três minutos depois já podiam ver o corpo de Lara estirado no chão, de bruços. Sua roupa estava suja, de sangue e de poeira. Logo em seguida Romeu pôde ser visto. Mantinha-se em pé ao lado dela, observando o corpo caído. Estava sem o manto, e podia-se ver as marcas azul escuro em seus braços desvanecendo e dando lugar ao sangue que brotava de sua pele.
Ainda no chão, Lara fechou os dedos sobre a espada que ainda segurava, como num espasmo involuntário. Seu rosto estava abatido no chão, seus olhos fechados, e sua respiração ofegante.

Não posso perder - pensou ela - Não agora que estou tão perto da vitória. Tão perto do reconhecimento - Sua mente lutava desesperadamente contra a invalidez do seu corpo. Naquele momento critico, Lara deveria demonstrar toda sua força de vontade e se por de pé pra terminar a luta. E força de vontade é o que ela tinha de sobra.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Contos de Altamir #28

Ano dez – Grande Arena de Agni
Enric pôs-se por baixo do braço de Agamenon e o ajudou a levantar enquanto a multidão aplaudia.
Akutenshi levantou-se de seu lugar no camarote junto aos conselheiros. Chegou-se a borda da frente e inclinou-se:

-Você não disse que o dragão ia lutar no segundo embate? - disse ele à menina que estava logo abaixo, na arquibancada - Não vi um dragão lutar. Nem ao menos vi fogo! - prosseguiu, num tom displicente, quase irônico.

A menina apenas olhou de volta. Um olhar sóbrio. E por alguns segundos pareceu um clima tenso, até que ela sorriu quase forçadamente e ele gargalhou.

-Tudo bem então... - disse ao terminar seu riso - Cavaleiro! - gritou para o centro da arena - Cavaleiro! - mas Enric não se virou. A multidão já parava de aplaudir a essa altura - Campeão! Diga seu nome e sua Linhagem!

Enric virou-se para ele com e toda multidão silenciou.
-Enric, senhor... Enric Scarlet, o quinto, filho de Apollyon o dragão amaldiçoado.
Era visível agora a inquietação da multidão. Akutenshi ergueu a mão direita retomando a palavra.

-Não conheço Scarlet com tamanha habilidade cavaleiro! E não acredito que exista um dragão que pode ser chamado pelo nome de um clã.

-Não existe mais, senhor. Eu sou o único que restou da minha linhagem sanguínea. O ultimo da primeira linha de sucessão dos Scarlt. Daqueles que descendem da Cidade dos Dragões – disse Enric excessiva seriedade.

-Majestade... É como deveria me chamar, cavaleiro - disse Akutenshi num tom quase zombeteiro, com um sorriso no rosto.

-Também não deveria me chamar de Cavaleiro, mas não parece se importar com isso - Enric virou-se e prosseguiu seu caminho até a porta da arena, ainda ajudando o Alvo.
Akutenshi sorriu virando-se de volta aos conselheiros.

-Peculiar... - disse ele antes de sentar-se, fitando o principal conselheiro.

-Acho que ele não gosta muito de Vossa Majestade - disse Levi, e logo depois se levantou e tomou a palavra, dirigindo-se a arena e à platéia - Como os dois lutadores do próximo embate já estão na arena, e acredito que nesse momento não haja nenhum empecilho para tal. Começaremos agora a próxima luta.

-Que problemático... - disse Romeu, dirigindo-se ao centro da arena.
Lara o seguiu. Ambos estavam prontos para a luta, e não queriam de modo algum, fazer menos que os que haviam lutado antes.

Ao chegar no centro da arena, estavam a cerca de cinco metros um do outro:
-Que comece a primeira semifinal! - exclamou Levi, e a multidão o acompanhou. Àquela altura, só queriam ver mais uma bela luta, não pareciam mais estar se importando quem seria o rei, afinal, já tinham assistido dois grandes embates e em um deles, assistiram a um dragão lutar. Já tinha sido até ali, o ápice da vida de muitos camponeses.

-Está pronta? - Perguntou Romeu, já com sua arma empunhada. Uma espada media em tamanho e de folha larga, uns 15 centímetros.

-Nasci pronta - Respondeu ela.

Ambos partiram para o ataque ao mesmo tempo. E houve um estrondo incrível no encontro das laminas.

-Nada mal - disse ele, mas não houve resposta.

Romeu era um homem esguio de movimentos suaves. Um rosto fino com olhar pesaroso. Seu cabelo amarrado atrás fazia um pequeno rabo de cavalo. Estava adornado de um manto azul claro que cobria seu tronco e braços até cotovelos, uma calça escura de linho e botas de couro simples.

Afastaram-se num pulo a dois metros pra trás, e novamente atacaram ao mesmo tempo, encontrando as espadas no meio do caminho. Lara pulou para traz novamente, mas Romeu manteve-se no mesmo lugar. Ela correu em arco na direção dele e desferiu um golpe na diagonal, que foi defendido com algum esforço. O contra-ataque foi imediato, com um golpe horizontal pelo lado oposto, igualmente defendido por ela.

O embate durou nesse nível de equilíbrio por pouco mais de cinco minutos até que Romeu resolveu falar:

-O que acha de acabarmos logo com isso? – disse ele – não gosto muito de lutas demoradas. São problemáticas.

-Se é assim que prefere – respondeu ela.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Contos de Altamir #27

Ano dez – Grande Arena de Agni

Enric levantou-se devagar. Tinha apenas um arranhão nas costas, como se algo tivesse passado raspando. Agamenon Lumbre ficou pasmo com a situação.

-Como você... Minha espada... Você... Você! – não conseguia sequer completar uma frase.

Enric bateu as mãos nos joelhos, tirando um pouco da poeira. Catou o machado do chão e virou-se para Agamenon.

-Belo golpe... Mas você cometeu um erro. Encantou sua arma com fogo, se não o tivesse feito, se estivesse apenas encantada como antes, você poderia ter até me matado. E como já pode deduzir, eu sou imune ao fogo.

-Então você conhece mesmo a habilidade dos Lumbre, e deixou que eu o atingisse só pra me mostrar que é superior – O Alvo retomou a tranqüilidade.

-Não, na verdade eu não sei usar machado. E seu golpe me acertou enquanto eu ainda me acostumava com o peso da arma – Enric jogou a arma a poucos centímetros de sua mão, fazendo ela giram em torno pro eixo do cabo. Segurou com a mão esquerda e fez dois movimentos rápidos de corte no ar, nas duas diagonais – Está pronto?

Agamenon se concentrou em sua espada e ela voltou a brilhar ao invés de emanar fogo. Enric sumiu aos seus olhos, e sem que ele notasse já estava recebendo um golpe lateral vindo cortar-lhe pela esquerda. Num súbito reflexo, ele conseguiu colocar a espada de encontro ao machado. O que não impediu que ele se projetasse no ar com a força do golpe. Novamente cairia a metros de distancia, no entanto Enric o alcançou a dez primeiros metros fazendo-o parar com um chute nas costas.

Que velocidade! – pensou Lara, quando Agamenon caiu praticamente à frente de Enric contorcendo-se de dor – Além de incrivelmente forte é inacreditavelmente rápido!

Com um olhar desapontado, Enric chutou a barriga de Agamenon. Ele rolou por quase dois metros, já sem sua espada. Enric pegou a espada do chão e andou devagar até o outro.

-Acabe a luta! – disse um dos conselheiros do sul – ele vai matá-lo!

-Não... Espere... – respondeu Levi – Veremos até onde ele vai.

Enric chegou ao lado de Agamenon e parou olhando-o caído no chão. Ele estava olhando para cima, com o olhar perdido.

-Vamos... Acabe com isso! – disse o moribundo.

-Já acabei – sussurrou o outro – A luta acabou! – Gritou olhando para os conselheiros. Levantou a espada branca que estava em sua mão na direção do peito do homem deitado, e atirou-a com força para baixo.

A platéia levantou-se de súbito com o susto.

-Exibido... – disse Akutenshi desdenhoso.

A espada entrou no espaço exato entre o braço e o tronco de Agamenon Lumbre. A multidão ao perceber isso aplaudiu e ovacionou. Enric virou-se em direção a saída.

-Enric... – o Alvo se esforçava para levantar-se – espere... – pôs-se de joelhos lentamente. Pelo canto de sua boca descia um fio de sangue. Ele tossiu e disparou um liquido espesso pouco avermelhado. A multidão silenciou – Ao novo rei – fez uma pausa, com a respiração ofegante – eu ofereço minha lealdade.

Levi levantou-se de súbito no camarote onde estava. Sabia que juramento era aquele.

-Ele ainda não é rei! – gritou de lá. Alguns perceberam até um tom de fúria.

Agamenon colocou um pé ao lado da espada e com as duas mãos segurou o pomo. Ainda com o joelho esquerdo no chão recomeçou.

-Quando eu era mais novo, meu pai me levou a Kamael, ele me disse que eu seria muito poderoso. E disse que um dia eu lutaria com um homem muito mais poderoso que eu. Um homem imune ao meu poder. O filho de um dragão. O rei de outras épocas me disse que eu não deveria me curvar a ele, que eu apenas deveria me curvar apenas ao meu verdadeiro rei, e a ele prestar o juramento de lealdade do fogo – parou um instante. Enric se virou e olharam-se nos olho – Ao filho do dragão, ofereço minha lealdade, minha espada e meu poder. A sua vitória será a minha vitória e a sua derrota a minha desonra. Eu juro pelo fogo e pelo sangue – Pôs a mão direita do peito e abaixou a cabeça. Com uma pequena fumaça saindo de seu peito, bem onde colocou a mão, ele arqueou de dor.

Enric abaixou-se e ajudou o Alvo a se levantar. A multidão levantou-se e aplaudiu de pé. Levi sentou-se aturdido, aquele era o juramento de fogo, uma espécie de maldição que ligaria para sempre o homem que o fez ao seu suserano.

No peito de Agamenon Lumbre estava gravado um circulo místico, ainda borrado pelo sangue, mas claramente já podia ser visto um dragão desenhado dentro dele.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Contos de Altamir #26

Ano dez – Grande Arena de Agni
Os portões da arena estavam abertos, mas a diferença de luz em relação à ante-sala impedia que eles pudessem ver alguma coisa no primeiro momento. Enric saiu e a multidão eufórica ovacionou, a arquibancada estava lotada. Logo atrás dele vieram Romeu Kurayuki e Lara Akuana seguidos não distante por Felipo Vuur. Levi ficou intrigado com a cena. Todos eles entravam ao mesmo tempo na arena, exceto um dos participantes da luta atual.

O Conselheiro estava sentado em um camarote eqüidistante às duas entradas, o mais confortável deles. Ao seu lado direito estava Akutenshi e quatro conselheiros, do sul e do norte, e a direita estavam os outros dois, da ilha central. Desde a divisão do território, essa foi a primeira ocasião em que os sete estavam presente.

Enric andou em passos largos até o meio da arena, quase arrastando o machado gigante que Lara havia lhe dado, e olhou para os Conselheiros. Os outros três que haviam entrado com ele na arena, ficaram perto da porta.

-Por um momento achei que todos resolveram lutar ao mesmo tempo! – disse Levi.

-Pra mim isso não seria um problema – respondeu Enric – mas já que temos que seguir suas regras...
Levi sorriu.

-Que comece então a segunda luta!
Enric olhou para o outro extremo na Arena. A porta se abriu lentamente e Agamenon Lumbre saiu. Trajando roupas simples de couro fervido e empunhando somente uma espada media de lamina clara, quase branca. O Alvo, como era chamado, tinha cabelo branco – desde a adolescência, quando foi iniciado em magia – liso e grosso, que chegava ao ombro, com uma expressão de seriedade e um rosto quadrado, ranzinza e com grandes jugulares.

-Acho que você deveria usar mais armaduras... – Enric sorriu enquanto esnobava a figura de seu adversário. Ele usava um manto preto e longo, como era de costume.
Pegou na parte inferior do manto e tirou-o pela cabeça num único gesto. Por baixo do manto usava apenas uma calça de linho e calçados de couro. Nada cobria o tronco, e no braço esquerdo, a antiga ferida era apenas um desenho. Um circulo místico com inscrições em malgo antigo (uma língua impronunciável para humanos), e um dragão vermelho no meio.

-Do que você está falando? Não está usando armadura nenhuma! – disse o outro.

-Não se engane, eu estou muito bem munido – sorriu para ele.
Agamenon correu em sua direção. Logo chegou e desferiu seus primeiros golpes. Com a espada tentou pelo flanco direito e pelo esquerdo, com golpes horizontais, sendo bloqueado pelo machado de Enric, empunhado na mão esquerda, ambas às vezes. Com um passo pra trás, Alvo tomou impulso para uma estocada, que foi defendida com a lateral do machado do outro. Enric não mostrava agilidade, nem muita técnica com a arma, mas os movimentos de seu corpo eram como os de um guerreiro experiente, que sugerem prever os golpes do adversário.

-Acho eu você deveria lutar de verdade. Desonra-me saber que não dará tudo de si nessa luta – disse Enric. O outro olhou intrigado – Conheço a técnica dos Lumbre, mas nunca lutei contra um realmente poderoso. Vamos... Dê tudo de si! – Agamenon sorriu.

-Se é o que você quer... – abaixou sua espada, deixando a lamina na horizontal na altura das coxas. Colocou a mão esquerda por cima da direita e em seguida, passou deslizando por toda extensão da lamina. Nesse movimento, a lamina foi ganhando luz própria. Ele afastou as pernas e girou a espada no ar fazendo um oito, e repetiu o movimento.
Com um movimento pra esquerda e depois um de salto pra direita, atacou a esquerda de Enric com um golpe diagonal. Dessa vez, mais rápido e forte. Enric conseguiu defender, mas logo depois um soco acertou-lhe o rosto. Com um passo para traz, retomou o equilíbrio, sacudiu a cabeça e sorriu. Retribuiu com um soco rápido, agora que a guarda do outro estava baixa, e em seguida um golpe extremamente forte com a lateral do machado, que o fez cair rolando a mais de dez metros de distância.

Metade da arquibancada levantou-se impressionada, a outra metade não teve reação. Levi, os outros conselheiros e o Akutenshi olhavam quase desdenhosos.

O Alvo levantou-se rapidamente, mas claramente afetado pelo golpe. Fez um movimento circular com a espada, e sibilou algumas palavras desconhecidas. Sua espada tornou-se um turbilhão de fogo, uma emanação luminosa de energia. Enric tomou uma postura séria, colocou o machado ao lado do corpo em postura de defesa, dobrou os joelho e redobrou a atenção.

Agamenon saltou de onde estava, com um som de águia. Num rasante chegou a Enric, golpeando-o pela esquerda. O outro defendeu com a lamina do machado. Essa é minha chance – pensou o Alvo.

Segurou a espada com as duas mãos e num movimento de rápido de rotação do corpo, atingiu o outro flanco de seu adversário.
Enric caiu dali a dois metros, de cara no chão. O golpe acertou as costas.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Contos de Altamir #25

Ano dez - Grande Arena de Agni
A primeira luta começou e alguns participantes ficaram na sala de preparação. Felipo Vuur vestia uma armadura negra com auxilio de seu irmão, Antoni, que havia participado da segunda etapa. Enric estava sentado na mesa bebendo e observando a cena quando Lara chegou.

-A que devo a honra...

-Guarde sua cortesia pra outra hora – ela o interrompeu – quero saber o que aconteceu lá – ele estava tranqüilo, com um sorriso calmo – Sei que você tem algo a dizer.

-Era lua cheia. Você reparou?

-O que você quer dizer? – Lara estava impaciente.

-Apollyon se alimentava naquela floresta. Sempre na noite da Lua Cheia, ou se preferir, na noite do Rei Lua – Lara observava confusa. Ele levantou-se, tomou um odre de vinho nas mãos e andou devagar, em direção a um assento confortável de três lugares encostado na parede do aposento – Você conhece a história de Altamir. Só não conhece os detalhes – enquanto sentava-se olhou para o outro lado da sala, onde Felipo se esforçava para entrar em sua armadura, uma cena semelhante a um embate – O primeiro rei a governar dois territórios em Altamir, antes de ser assim chamada, foi Enric Scarlet, o primeiro de seu nome, e o ultimo, antes do próprio

Altamir Gilgamesh, foi Yuno Scarlet, o Sangue de Dragão, filho de Enric. Cerca de trezentos anos antes da chegada dos Gilgamesh em nosso país – fez uma pausa e deu um grande gole no vinho – A fortaleza dourada foi erguida por Enric Scarlet, o segundo de seu nome, e concluída por Leon Scarlet, Presas de dragão, muito antes do reinado de Altamir Gilgamesh – mais uma pausa e outro gole – O ultimo rei em Agni, Roan Scarlet, Asas vermelhas, governou toda ilha central. E antes dele, Enric Scarlet, o terceiro de seu nome – Lara estava agora sentada ao seu lado.

-Por que esta me contando sobre a história de seu clã?

-Na verdade essa é a minha história e essa é a minha linha direta de antecessão. Eu sou Enric Scarlet, o quinto de meu nome. Filho de Apollyon Scarlet, que por sua vez, é filho de Enric Scarlet Quarto. E de todos esses que citei, nenhum morreu por idade avançada. Todos foram mortos em combate.

Os olhos de Lara quase pularam pra fora. Sua expressão se tornou vazia e ela se inclinou levemente para traz.
Enric, filho de Apollyon, o Dragão Amaldiçoado – pensou ela, ou talvez até sussurrou.

-Em toda História de Altamir, Enric foi um grande nome, sendo sempre sucedido por um grande dragão – Enquanto ele falava, ela parecia fazer um leve sinal de negação com a cabeça – E os filhos de Grandes dragões tem por herança o fado de matar seu pai – por um momento, ele perdeu a disposição com que contava a história – Foi Apollyon quem matou o homem que me criou, que na verdade nunca foi meu pai, e fui eu quem matou Apollyon. E só quando eu o matei soube que era meu verdadeiro pai, pois muito do que ele sabia foi transmitido pra mim de alguma forma.

Lara sorriu meio nervosa.

-Então quer dizer que agora você é um dragão? Isso é um absurdo – gargalhou.
Enric riu junto, no entanto, o riso dele era sincero. Mesmo tendo perdido seu pai, pela segunda vez.

-Acho que é melhor você perder na primeira luta. Não quero ser obrigado a lutar com você – disse ele.

-Pois é... Eu também não ia querer lutar com um dragão! - Gargalharam.
Lara sentia um misto de nervosismo, e confusão. Muitas informações ainda não tinham sido digeridas completamente, além disso, ela não sabia se podia acreditar nele.

-Eu falo sério – pararam de rir, e agora trocaram um olhar sério – Não tenho porque mentir pra você...

Ela não teve reação. Ele levantou-se e deixou a caneca de vinho pela metade nas mãos dela. Pegou o machado que estava em cima da mesa – aquele que ela o havia dado – e virou-se à porta.

-Me deseje boa sorte. Enquanto ele andava até a porta, Romeu Kurayuki entrou com um ar estafado. Ainda empunhando uma espada larga, e um pouco sujo de poeira.

-Que problemático – Disse Romeu – Chegou uma hora que eu achei que ele ia chorar! – Enric sorriu.

-Seria bom se vocês viessem assistir minha luta – Romeu parou e observou Enric de cima a baixo. Todos na sala deram atenção – vocês não podem perder o renascimento do dragão – e aquele sorriso insano reapareceu no seu rosto.

-Vou assistir do melhor lugar - Romeu embainhou sua espada e saiu com Enric pela mesma porta.

Lara veio atrás deles, e logo depois, Felipo Vuur.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

O Reencontro de Anjos - ♛ Cαpítulo IV - Parte III

Kanade entrou na casa novamente sem me falar nada, mas em pouco tempo ela já estava de volta com o IPod seguro na mão direita, ela se sentou novamente ao meu lado e colocou um dos fones em meu ouvido e o outro fone no dela. Depois de alguns segundos uma música começou a tocar, era Alchemy das Girls Dead Monster. Nós a ouvimos até o final e aquelas sensações de antes voltaram com tudo, era inexplicável. Perguntava-me se ela sentia o mesmo quando a ouvia.
Isso me lembrou que eu havia preparado um presente para ela, não era bem um presente, talvez me ouvir cantar soasse mais como um presente de grego, mas tinha que aproveitar o pouco de coragem que me veio.
Tirei os fones dos nossos ouvidos, e aproximei meu rosto lentamente, ela não recuou apesar de perceber que o rosto de Kanade parecia estar queimando de tão vermelho que estava. Logo meus lábios tocaram um pedaço da orelha dela e o ar quente que saia da minha boca com certeza a agradava já que os pêlos do corpo dela estavam completamente arrepiados.
Aisaretai demo aisou to shinai
Sono kurikaeshi no naka wo samayotte
Boku ga mitsuketa kotae wa hitotsu kowakutatte kizutsuitatte
Suki na hito ni wa suki tte tsutaerunda
("Eu quero que você me ame,mas eu não acho que vá fazer isso"
E ando sem rumo enquanto repito isso pra mim
É a única resposta que tenho,mesmo se eu estiver assustado ou machucado
Vou dizer "Eu te Amo" pra quem eu amo)

Quando terminei de cantar ouvi alguns soluços, Tachibana estava chorando. Não sabia que eu cantava tão mal assim, não foi mesmo uma boa idéia usar minha voz para presentea-la.

- Sabe... Antes de você chegar eu recebi uma notícia dos meus pais. Era algo que eu esperava a muito tempo e eles resolveram me contar hoje como um presente. Mas agora me sinto estranha, não sei bem se quero mesmo esse tipo de coisa.

- E o que foi isso?

- Há muito tempo quis estudar na América e me formar por lá, minhas notas eram boas mas não o suficiente para uma bolsa. Esse é o meu último ano, minha última chance e finalmente meus pais receberam uma ligação e eu fui aceita, mas preciso ir para lá imediatamente, mas precisamente amanhã as 10 horas, meus pais fizeram questão que todos os meus amigos comparecessem a essa que se tornou uma festa de despedida.

A notícia soou como um soco na barriga para mim, e algo parecido com nostalgia invadiu meu corpo, como se já tivéssemos nos separado antes. Coisa que não havia como ter aconcido já que nos conheciamos a menos de 24 horas.

Eu queria gritar para ela ficar, implorar e espernear, mas de que isso adiantaria? Aquilo era o sonho dela e eu não tinha o direito de impedí-la, na verdade nem direito nem moral para isso, ela estava abandonando amigos e parentes, não seria um simples conhecido que conseguiria fazê-la desistir disso, e se a dúvida que ele sentia fôsse realmente por causa dele estaria no caminho dela, algo que não queria.

- Você deveria estar chorando de alegria, é seu sonho e finalmente vai realizá-lo - Forças para falar isso não sei de onde tirei e a força que me impedia de chorar já estava se esgotando, tinha que sair dali o quanto antes.

- Mas eu...

sexta-feira, 15 de julho de 2011

O Reencontro de Anjos - ♛ Cαpítulo IV - Parte II

Olhei para todos os lados procurando-a, foi então que ouvi sua voz novamente.

- Aqui no interfone, seu bobo - Ouvi os sons de sua risada parecendo se divertir com minha confusão então percebi que ela me observava de uma das janelas.

Ela acenou para mim e fez sinal para que eu esperasse. Encostei-me a um poste que estava ao meu lado apoiando um dos pés no mesmo e em menos de um minuto ela já abria o portão de sua casa vindo ao meu encontro. Os cabelos soltos como sempre deixando uma parte cair sobre seus seios e a maior parte dele escorrido em suas costas. Ela estava maquiada diferente das outras vezes que havíamos nos encontrado no mesmo dia, mas sem muito exagero, suas bochechas estavam rosadas e o batom em seus lábios parecia ser da mesma tonalidade. Usava um vestido branco com um pequeno laço na parte superior direita coberto em partes pelo cabelo dela, seus ombros e pernas estavam à amostra, “incrivelmente linda”. Era a única coisa que eu conseguia pensar naquele momento.

- Então você vem aqui na minha porta depois de ter sido convidado, não se da nem ao menos o trabalho de chamar e vai embora? - Ela falou interrompendo o silêncio que se formava durante a admiração.

- Não é bem assim, eu...

- Eu estava vendo tudo pela janela, e você...

- Quer dizer que estava tão ansiosa pela minha chegada que não conseguia sair da janela, imagino como ficou feliz por me ver - No jogo de interrupções parece que finalmente a venci, ela parecia tentar pronunciar alguma coisa, mas sua fala era cortada e no fim não saiu mais nada da boca de Kanade. Ela me olhava, suas bochechas mais vermelhas ainda, parecia um pouco irritada com minha insinuação apesar de não discordar dela em nenhum momento agora com a cabeça baixa mexendo o pé no chão como uma criança birrenta.

- Vamos entrar então, com essa roupa você não vai durar muito tempo aqui fora nesse frio - Dessa vez foi eu quem deu um fim ao silêncio.

Ela entrou primeiro e eu a segui, caminhamos sobre algumas pedras bem ajeitadas cercados pelo que parecia ser um belo jardim antes de ser completamente tomado pela neve, agora tudo em volta era branco até o estreito caminho entre o portão e a porta da casa pelo qual seguíamos. O lugar era bem simples e por fora percebia que não deveria ter mais do que dois andares. Ela abriu a porta e entramos, levei um pequeno choque térmico com a mudança de temperatura, dentro da casa estava quente talvez pela concentração de muitas pessoas.

Aos poucos fui apresentado a cada um dos amigos e amigas de Kanade, entre elas conheci até a garota que me deu uma voadora mais cedo, ela se desculpou com tanta sinceridade que cheguei a me sentir culpado mesmo sendo a vítima. Por fim conheci os pais dela e meu nervosismo diminuiu bastante depois disso já que eles conversavam bastante sem nenhuma suspeita. Pela primeira vez em muito tempo me senti normal e bem vindo em algum lugar onde ninguém me olharia diferente por não ter uma família.

Por um momento enquanto jantávamos parei para pensar em quando acordei, nunca imaginaria que meu natal seria tão diferente, durante todo esse tempo que degustávamos de tudo o que havia na mesa não conseguia parar de olhar para Tachibana. Nós fomos os primeiros a terminar a refeição pedimos licença aos outros e nos voltamos par a varanda. Era iluminada apenas pelas luzes que vinham de fora: postes e Lua. O que me fazia imaginar várias cenas românticas com a garota que estava agora ao meu lado. Logo ela se sentou em um pequeno muro a nossa direita e eu me sentei ao seu lado apoiando a palma das minhas mãos no murinho. Kanade balançava as pernas enquanto eu encarava uma nuvem que por alguns segundos encobriu a Lua. Estávamos parecendo duas crianças imaturas sem palavras, e era isso mesmo.

Contos de Altamir #24

Ano dez - Grade Arena de Agni
A Grande Arena de Agni era uma elipse de aproximadamente cinquenta metros no eixo menor e cem na perpendicular. O chão era em barro pisado com alguns resquícios de grama, cercado por um muro largo de um metro e meio em pedra. Atrás do muro, arquibancadas em arco, arrumadas de maneira que todos pudessem ver o que acontecia no centro. Em determinadas partes na arquibancada havia camarotes.
Na arena, havia duas entradas, nos extremos. Eram grandes portas de madeira, com aproximadamente três metros de largura e quatro de altura, que abriam no meio. Atrás das portas uma antessala, e logo ao lado, um cômodo confortável e espaçoso, o salão de preparação para luta.

A arena estava cheia, não havia mais lugares na arquibancada e as pessoas que chegavam se amontoavam nos portões. Quando Lara e Enric foram anunciados por um cavaleiro da guarnição dos Conselheiros a multidão abriu espaço. Enquanto eles passavam, ouviam a gritos da multidão. Alguns incentivando, outros amaldiçoando, e havia uns até que elogiavam maliciosamente a moça.
Foram direto ao centro da arena, onde já se encontram os outros quatro. Felipo Vuur, Romeu Kurayuki, Dante Vannsart e Agamenon Lumbre. Pouco depois deles, entraram os conselheiros, vestidos em túnicas reais e adornados por mantos costurados a fio de ouro. Enquanto Levi e os outros dois chegavam ao centro da Arena, a multidão foi se aquietando.

-Bom dia, senhores, senhoras – as arquibancadas silenciaram. Ainda ouvia-se barulhos vindos de fora, mas era possível ouvir claramente a voz de Levi – Hoje presenciaremos um acontecimento incomum, que só foi visto pela ultima vez a mais de quinhentos anos. Uma disputa pelo trono das cidades de Agni e Varuna! –a multidão explodiu em ovações e aplausos. Com um gesto Levi conseguiu retomar a palavra – Sem mais delongas, devo anunciar como será a terceira etapa dessa disputa, que começará hoje à tarde – tirou um tecido enrolado de dentro do manto – aqui estão os nomes dos senhores e da senhora – abiu o papel e mostrou que havia nele escrito o nome dos seis que estavam ali seguido do brasão de sua casa. Levi se virou mostrando o tecido aos que estavam ao redor – a etapa de hoje será muito simples – fez uma breve pausa – a partir do sorteio que faremos aqui, aos olhos do povo, acontecerá duelos diretos, um contra um – toda a arquibancada começou a comentar ao mesmo tempo.
-Como assim? Vamos lutar entre nós? – perguntou Lara – uma luta não prova nada. Depois de tudo que passamos vocês vão escolher um rei em uma disputa de quem sabe brigar melhor?!
-Na verdade, não será observada apenas a luta, mas a conduta de cada participante durante todas as três etapas do torneio – disse Gerald, que estava ao lado direito de Levi.
Levi colocou o papel no chão, e sussurrou algumas palavras. Onde estavam os nomes surgiram pequenas esferas, semelhantes aos amuletos que coletaram. Nas esferas também estavam gravadas o nome e o brasão de cada um deles. Pegou nas bordas do pano e fechou como um saco.

Gerald tirou um papel com uma tabela de confrontos em fluxograma com os espaços ainda a preencher.
-O sorteio é simples. A ordem dos nomes sorteados será a mesma da tabela. E cada um vai tirar um emblema, para que não haja suspeitas de trapaça – neste momento Lara notou que na tabela, o primeiro e o ultimo sorteados estariam imediatamente na segunda fase, de um total de três lutas – Mulheres primeiro – o conselheiro sorriu.
Lara tirou o próprio nome e logo em seguida foram sorteados, Romeu Kurayuki e Dante Vannsart. Era muita coincidência, os três de Varuna na primeira chave enquanto os outros de Agni estariam na outra.

Posteriormente foram sorteados Enric Scarlet, Agamenon Lumbre e Felipo Vuur, completando assim a tabela. Nesse momento Lara se sentiu um pouco aliviada, pois não teria que lutar contra Enric, pelo menos nas duas primeiras fases.
-Sorteados os nomes, estão liberados para fazer uma refeição. À terceira hora dessa tarde começará a primeira luta, entre Dante Vannsart e Romeu Kurayuki. Em seguida, Enric Scarlet contra Agamenon Lumbre. Os vencedores terão pela frente Lara Akuana e Felipo Vuur.

sábado, 9 de julho de 2011

Contos de Altamir #23

Ano dez – Floresta Amaldiçoada, ao sul de Agni
-Já era hora de você acordar.
Agora estavam na caverna que ele havia mostrado a ela.
-Por quando tempo eu dormi? – Lara estava sentada perto dele, no banco de pedra.
-Um dia e uma noite. Já está amanhecendo.
Ele sentou-se na cama de pedra. Estava com uma atadura em volta do tronco e outra na perna direita, no entanto, olhou primeiro para seu braço esquerdo. Ficou apertando o bíceps e girando o braço, como se procurasse algo.
Lara só observava. Ele sorria. Um sorriso insano, que lhe fez tremer. Por um instante não pareceu humano. Olhou pra ela enquanto se desfazia sua faceta. Ela ainda pôde ver duas linhas em sua testa, que pareciam estar formando algum desenho, se desmanchar.
-Sonhei que vi você lutando – fez uma pausa com um sorriso mais amigável no rosto e a cabeça inclinada pra direita – No sonho você tinha uma espada longa e esguia e com ela cortou um homem no meio – ela se levantou e pegou de cima da mesa sua espada embainhada. Puxou da bainha de madeira e lhe mostrou a escrita.
-Mizuken... Acho que a primeira palavra é Mizuken... – ele olhou sério – e é assim que será chamada, afinal, uma boa lamina merece ter um nome.
-Já vi essa inscrição em outra espada.
-Sabe o que quer dizer?
-Não... Tudo que eu conheço além do idioma comum é um pouco de Sumö, que aprendi com uma arquibruxa. E isso é muito diferente de Sumö – Levantou-se devagar e notou que estava só com suas roupas intimas. Olhou para a perna enfaixada, e começou a coçar por cima – Onde arranjou essa espada? Na ultima vez que a vi não portava armas.
-Alguém me deu – O manto de Enric estava em cima da mesa. Ela pegou e jogou para ele, junto com o restante de suas roupas. Ainda na mesa, por baixo do mando havia um machado – e isso é pra você.
-Então, anda roubando...
-Um homem morto não precisa de armas – ele sorriu e se sentou novamente.
-Você matou mesmo aqueles dois – ele parou um instante e começou a tirar a faixa da perna – eu realmente achava que você era uma garota mimada de castelo.
Não houve resposta para isso. Ela apenas deu as costas e começou a arrumar suas coisas, no cavalo.
-É melhor que você não tire isso – virou-se novamente para ele – Ainda não está... – parou. Enric já estava sem a atadura e não havia nenhum ferimento, nem cicatriz.
Ela não teve reação, e ele parecia habituado a isso. Começou a tirar a outra que estava em seu tronco e ela não prestava atenção em mais nada. Quando ele removeu completamente a atadura ela veio ver suas costas. Não havia nem sinal de ferimento, só uma fina camada da pasta de ervas que ela havia feito.
-Incrível – ela passou a mão em suas costas, removendo a pasta. Ele virou-se lentamente, e ficou de frente para ela. A mão dela agora estava no peito dele. Tocou rosto dela com a mão esquerda e a beijou.
Em poucos segundos ela se afastou, e deu as costas pra ele.
-Temos que ir embora – Pegou o restante de suas coisas e montou o cavalo.
Quando ele saiu, ela estava esperando lá fora, a poucos metros de distancia da porta da caverna. Desviou o olhar quando ele a olhou.
-Se achar melhor, podemos ir devagar – disse ela sem olhar – pra que seus ferimentos não abram novamente.
Ele montou e saiu na frente sem dizer uma palavra, e foi assim toda a viajem até Agni.
Ao chegarem a cidade, não havia ninguém esperando. Não houve festa nem aplausos. Passaram quase despercebidos, aos olhares dos moradores comuns. Apenas alguns acenos e sorrisos, dos conhecidos. A cidade parecia mais cheia do que antes da partida deles, e todos pareciam estar indo pra um mesmo lugar.
Os dois foram direto ao castelo, onde encontraram Levi na porta.
-Bem na hora! – disse ele. Estava bem vestido, e ornamentado como se estivesse indo a uma cerimonia. Havia também uma felicidade incontida estampada em seu rosto – quase começamos sem vocês - Os dois ficaram apenas olhando-o sem entender – Ah, já tinha me esquecido... estamos indo a Grande Arena de Agni. É onde acontecerá a terceira e ultima etapa.
-Mas, e os amuletos?
-Sim! Sim! Podem me entregar agora – ela tirou e do bolso dois amuletos, o primeiro, que era uma pedra preta e o vermelho, que encontrou com Enric.
Lara estendeu a mão para entrega-los juntamente com a espada. Ele pegou cada um dos amuletos em uma mão e deixou a espada com ela.
-Me encontrem na Arena, preciso guardar isso no seu devido lugar – Lara tentou pronunciar alguma coisa – É sua – disse ele antes – deu as costas e ao chegar perto da porta os dois já estavam se virando para ir – Enric! – se virou novamente – Isso é seu – jogou o amuleto pra ele – Eu sinto muito... E estou muito agradecido.

sábado, 2 de julho de 2011

Contos de Altamir #22

Ano dez - Vila dos Selos, Floresta Amaldiçoada
Em um dos lados na nova lamina de Lara havia inscrições num alfabeto que nunca tinha visto. Perfeitamente entalhadas, as letras pareciam algum tipo de decoração.
-Me parece que ela não quer cooperar, Julian – disse o menor. Era um homem de baixa estatura, menor que Lara, esguio, com uma feição bestial, e que mostrava seus dentes tortos num sorriso zombeteiro enquanto seu cabelo liso e fino caia na altura dos olhos. O outro era grande e forte como um touro, com aparência apalermada e um sorriso bobo no rosto, cabelo muito curto e rosto sem barba – Vamos pegar o amuleto à força então.

Julian puxou um machado de duas mãos por trás de si (do tamanho e largura de seu tronco) com apenas uma mão, girou ele desenhando um oito no ar e se pôs em postura de ataque, com a arma na mão direita, ao lado do corpo e a mão esquerda aberta à frente.
-É sua ultima chance moça, dê aqui o amuleto – à sua frente, Lara não tinha expressão nenhuma no rosto, era apenas o vazio e a concentração de um mestre Kendo. Segurou a espada com as duas mãos e pôs a frente do corpo, com os joelhos e braços perfeitamente flexionados em uma postura impecável – Olha só Julian! Ela quer lutar! – gargalhou.
-Vamos acabar logo com isso – sussurrou algumas palavras em Vaês, um dialeto perdido da cidade de Varuna.

Julian gargalhou abobalhado, o outro sacou sua arma, uma espada de assassino curta e reta (algo incomum em Agni). O primeiro partiu pra cima de Lara a toda velocidade, o segundo fez alguns gestos com a mão esquerda segurando a espada logo abaixo dos olhos e logo o seguiu.
-Com toda força Julian! – gritou Sunny antes do primeiro golpe – não vamos pegar leve só porque ela é uma mulher – e foi exatamente o que ele fez. Correu a pequena distancia entre eles, e desferiu um belo golpe horizontal, partindo da direita e usando as duas mãos.

Lara era só concentração. Parou o golpe com a espada em pé, com um movimento lateral simples, sem tirar os pés do chão. A força do machado fez com que ela se deslocasse involuntariamente alguns centímetros pra sua direita, o que não mudou sua postura e tirou um pouco de sua concentração. Mesmo antes que ela pudesse revidar o outro surgiu a sua direita como um zumbido, numa velocidade incrível, ele nem ao menos tocava o chão quando segurando a pequena espada no sentido oposto, com a mão esquerda fez um movimento pra enterra-la no lado direito de Lara. Ela por sua vez, soltou a mão direita da espada, fez um curto movimento com o tronco para desviar do golpe, apanhou o pulso de Sunny e o jogou contra o corpo de Julian.

Caíram amontoados, a três metros de distancia. Sunny levantou enfurecido enquanto o outro levantava lentamente ainda meio atordoado pela pancada. Agora foi o menor que teve a primeira iniciativa, se inclinou para frente e saltou, percorrendo os três metros de distancia sem tocar o chão. Desferiu dois golpes na diagonal, que foram defendidos secamente por Lara antes que ele tocasse o chão a sua frente. Após o terceiro, ela fez um movimento giratório de corpo, fazendo-o passar ao seu lado e acertou com a coronha da espada a nuca dele. Sunny caiu. Logo em seguida, o outro já estava a sua frente com o machado a descer-lhe sobre a cabeça. Ela pôs sua espada na horizontal e defendeu segurando com a mão esquerda o lado da lamina.

Vamos ver de que é feita essa espada, pensou. Era muito risco defender um golpe com esse peso dessa forma, no entanto, a espada resistiu. O homem, não contente, lhe acertou o peito com o pé direito. Ela percorreu mais de três metros até atingir com força o que antes era o muro de uma casa. Caiu sentada.

Levantou apoiando-se na espada. E quando menos percebeu, Sunny estava a sua direita novamente como da primeira vez. Que inseto irritante, pensou. Dessa vez empunhava sua arma da maneira correta. Ela defendeu, com a espada em pé, e imediatamente viu o homem se contorcer no ar pra lhe acertar um chute do lado oposto. Acertou seu rosto. Não tinha a mesma força de Julian, mas conseguiu desequilibra-la. Dois passos à direita foram o suficiente pra reaver o equilíbrio. Recobrando sua postura foi atacada novamente por Julian. Dessa vez, esquivou-se ligeiramente pra direita. Ela tinha abertura para revidar com um soco ou chute, mas um golpe físico dela não afetaria um homem daquele tamanho.

Preciso me acalmar, ou vou acabar morrendo aqui! – ela parou e abaixou a espada. Os dois estavam perto de si, no entanto, não o suficiente pra acerta-la. Embainhou a espada e fechou os olhos. Suspirou tão fundo que eles puderam ouvir.
-Não adianta desistir agora! Você já está morta!
-Não... Vocês que estão mortos! – Abriu os olhos. Parecia tão concentrada quanto no inicio da luta – ou talvez mais.

O menor partiu pra cima dela, em dois passos já estava a sua frente desferindo uma estocada que lhe atravessaria o coração. Parou. Antes que pudesse perceber a espada de Lara tinha atravessado seu peito.
-Mas, quando? – foram suas ultimas palavras.

Ela arrancou a espada do peito dele e embainhou novamente, enquanto o outro se atirava com tudo pra cima dela enfurecido, girando o machado com as duas mãos, num golpe que partia da esquerda. Ela abaixou-se e se esquivou girando. Enquanto passava por baixo de seu braço, sacou sua espada e partiu o homem ao meio.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

O Reencontro de Anjos - ♛ Cαpítulo IV - Parte I

No caminho de volta para casa passei por algumas lojas. Olhava distraído para as vitrines iluminadas por pisca-piscas de várias cores e tamanhos, boas promoções de natal. Foi então que lembrei que seria bom levar algum presente já que estaria visitando a casa de desconhecidos. Entrei em uma dessas lojas que vendem tudo para garotas, passei pela parte de roupas, calçados, lingeries... - Tosse.

No fim das contas não consegui pensar em nada para dar a Kanade, eu nunca havia presenteado ninguém muito menos uma garota. O que elas gostam? Não fazia a mínima idéia, se minha mãe estivesse aqui ela poderia me ajudar nisso agora.

Pensando em meus pais lembrei-me de como meu pai costumava deixá-la feliz em seu aniversário. Ele a levava até a varanda no final da noite sentava os dois em cadeiras de balanço observando as estrelas que cintilavam nos céus e cantava algumas músicas românticas, ela se derretia toda, o velho cantava bem não dava para negar.

Eu não sabia tocar e minha voz era horrível, mas não tive uma idéia melhor. Sai da loja as pressas até finalmente chegar em casa.
Quando cheguei já eram 18h30min. Havia marcado de chegar à casa de Kanade às 20h30min. Durante esse tempo que me restava experimentei algumas roupas, fazia tempo que não comprava novas e tive muito trabalho até achar algo que parecesse bom. Antes de me trocar passei alguns minutos na banheira, apoiei meus braços nas bordas dela assim como a nuca e encarei o teto branco do banheiro por alguns segundos antes de fechar meus olhos. Assim que fiz isso um flashback começou em minha cabeça, começou no momento em que vi a garota encostada em frente à loja de conveniência, em seguida o hálito dela me deixando em transe e nossos olhos cruzados sem perder o foco em nenhum momento. Depois o reencontro na loja de CDs, quando sentei ao lado dela e ela recuou e por fim a pequena despedida, pensar na palavra despedida associando a ela me dava um tremendo aperto. Suspirei e finalmente reabri os olhos.

- Isso tudo realmente aconteceu hoje?

Levantei-me e me enxuguei enquanto saía do banheiro me enrolei na toalha. Voltei para o quarto e comecei a passar as roupas que havia escolhido. Estava distraído e quando olhei para o relógio ele já marcava 20h00min. Apressei-me a trocar de roupa vestindo o casaco preto e uma calça branca. Coloquei as luvas e o gorro e saí de casa e logo me dirigi ao metrô pegando o primeiro que passava.

Quando cheguei ao lugar marcado pelo endereço a rua estava vazia e aparentemente até sombria, mas não era esse o clima, à medida que eu caminhava rua a dentro percebia que por cada casa que passava ouvia conversas altas diferentes as famílias e amigos já estavam reunidos o que me deixou um pouco nervoso pensando que ao entrar na casa de Kanade todos me olhariam de forma estranha. A essa altura eu já estava parado a frente da casa dela e pensava seriamente em voltar. Não conseguia ouvir a voz dela em meio à pequena algazarra que vinha de dentro.

Dei a volta para ir embora depois de muito pensar.

- Você não vai mesmo entrar? - Era a voz de Tachibana vinda de algum lugar que ainda não havia notado.

sábado, 25 de junho de 2011

Contos de Altmir #21

Ano dez - Vila dos Selos , Floresta Amaldiçoada
Já estava vestida com o manto de lã quando apareceu naquele lugar, com a espada embainhada e presa no seu cinto. Correu em direção a Enric sem prestar atenção em mais nada, ajoelhou-se ao lado dele e perdeu o fôlego ao olha-lo. Havia uma poça vermelha ao seu redor e ela pensou que estivesse morto. Lara tremia assustada. Olhou para os lados e percebeu onde estava.
A vila dos selos estava quase completamente incendiada, exceto pela casa central, que se manteve intacta. Cinzas caiam sobre eles, ela verificou se ainda estava vivo, aproximou seu rosto e sentiu a respiração fraca.

-Me desculpe – sussurrou. Ela fez um movimento brusco pra traz – não chegaremos primeiro.
Ele está tão perto da morte, como pode ainda pensar nessa disputa? Pensou ela.
-O que aconteceu aqui? O que é toda essa destruição?
-Fogo – suspirou pesadamente – o fogo que queima almas – falava lentamente, e com grandes pausas para respirar – fogo de dragão... De dois dragões – tossiu e respingou sangue na roupa dela.

-Não fale! Só vai aumentar os sangramentos!
-Sei que não vou morrer aqui, as feridas já estão se fechando, posso sentir – sua voz soava aparvalhada.
-Não fale besteiras, você está tossindo sangue! Provavelmente teve algum órgão perfurado.
-Muitos! – tossiu novamente, mas dessa vez não houve sangue. Fechou os olhos e riu debochado – pelo menos eu o matei – tinha dificuldade de manter-se acordado.
-Quem você matou?
-Apollyon... Eu matei meu pai.
-Do que você está falando? Seu pai morreu há muito tempo – ele desmaiou – Enric! Acorde! – pegou pelos ombros e o sacudiu com vigor, até que da mão dele caiu uma pedra. Era vermelha, escarlate como os olhos dele. Quando pegou a pedra, notou que pouco ao lado havia um objeto branco de vinte e cinco centímetros, na forma de um canino. Era um dente.

Apanhou do chão com cuidado e examinou por alguns instantes. Tinha realmente a forma de um dente, no entanto, parecia muito mais resistente. Afiado como uma espada, e brilhante como vidro. Além disso, podia sentir uma emanação de energia dentro do objeto. Guardou em um bolso por baixo do manto, tanto o amuleto quanto o dente e se virou para Enric.

Lara tinha habilidades básicas de cura, magia de iniciante, que lhe seria muito útil agora.
Tirou o manto de lã e notou que as feridas já estavam estancadas, ainda tinham cor viva, de carne cortada recentemente, no entanto, já não sangravam. O que mais lhe chamou atenção foi uma ferida que tinha nas costas, muito profunda e do mesmo diâmetro do dente, provavelmente foi assim que ele foi arrancado, pensou ela. Rasgou um pedaço de seu manto e fez uma limpeza superficial usando o cantil de água que trazia consigo.

Enric tinha um porte razoável, pele acobreada e cabelo negro curto. Era um corpo muito marcado por cicatrizes de fogo. A orelha deformada era o que mais incomodava Lara, um ferimento causado pelo próprio pai dele. Ela só conseguia pensar em o que ele queria dizer com “matei meu pai”.

A pele dele é dura, parece couro de um animal de grande porte. Não... É muito mais Grossa, e escamada! É pele de dragão!

Após limpar suas feridas, ficou observando a maior nas suas costas, era como se diminuísse enquanto olhava.

-Olha o tamanho dessa ferida, você deveria estar morto – dizia para o homem desacordado – tenho que tirar você daqui antes que...
-Antes que chegue alguém pra matar vocês dois? – um calafrio atravessou Lara. A voz desconhecida vinha de traz de si. Não se virou. Primeiro ajeitou o corpo desmaiado de Enric.

-Se for embora agora, pouparei sua vida – levantou-se ainda de costas, deixando o manto cair. Pôs a mão direita no punho da espada. Estava à esquerda de seu corpo, e só agora ela notou que tanto a guarda quanto o pomo havia mudado. No pomo agora havia uma pedra azul escuro com formato parecido com o amuleto de onde a espada surgiu, no entanto, menor. A guarda, simples e achatada, não chegava a ter quinze centímetros de diâmetro. Uma forma mais apropriada para uma espada de duas mãos (uma Catana longa, levemente curvada), com um punho estável e um formato simples, que transparecia sobriedade.

-Nos dê o amuleto, não queremos machucar uma moça perdida na floresta – um outro homem sorriu e ela teve certeza de que eram participantes da competição.

Lara se virou lentamente sacando a espada. Posicionou sua arma ao lado do corpo e olhou diretamente para os adversários: Sunny Shine e Julian Marin.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Contos de Altamir #20

Ano dez - Baia das Flores
Aron Kurayuki, o homem dos cem olhos... Lara conhecia a lenda de um Kurayuki cego que nunca perdeu uma luta, só não sabia que aquele era seu pai.
Ela tinha olhos castanhos e cabelo escuro, quase negro (como os dele foram um dia), que descia ondulando até o meio das costas. Estava sem todo aquele manto, e se sentia mais à vontade com sua roupa perfeitamente ajustada ao corpo, que privilegiava os movimentos. Um gibão de couro fervido por cima de uma camisa de seda fina e uma bermuda de linho negro que não chegava ao joelho, além dos calçados de couro.

Seus olhos brilhavam. Falavam sobre a mãe de Lara, Társia Akuana, que morreu pouco depois de seu nascimento e também era uma guerreira especialista em quase todos os tipos de armas. Habilidade que aprendeu com sua família. Tudo isso ela escutava do velho sentado no cais.
Era muito raro o casamento de duas pessoas de clãs diferentes em Varuna, e quase impossível entre os Kurayuki e os Akuana. Eram como os Montecchio e Capuleto, que rivalizavam em tudo, por isso ela não tinha sido aceita entre os Kurayuki, e assim ela teve que ser criada pelos tios. Sua mãe era a herdeira dos Akuana e seu pai era o que consideravam portador Habilidade Milenar, ou simplesmente Kama. Uma habilidade singular que era passada hereditariamente há séculos.

Contava-se que Aron perdeu a visão lutando ao lado de Kamael contra invasores na ilha do sul (numa época em que os Conselheiros eram os maiores guerreiros de Altamir). Criaturas de forma humanóide que emanavam um brilho cintilante pela cabeça e explodiam em um feixe de luz quando derrotadas (foi como cegaram dezenas no exercito de Sundra, fazendo-os se retirar da batalha). Por fim apenas Kamael e Aron retornaram ao campo para lutar. Acabando com a ameaça ambos voltaram feridos. O rei perdeu metade de uma orelha, teve no braço esquerdo um ferimento que quase o decepara na altura do bíceps e outro não tão profundo na perna esquerda; enquanto Aron, sem visão, o trazia carregado nas costas.
Naquele lugar a temperatura era mais que agradável, o sol nasceu exatamente no meio da abertura da baia, já havia amanhecido há algumas horas, mas o calor era brando, acompanhado da brisa fria matinal.

-Então, eu devo aprender a habilidade milenar?

-Na verdade não... Essa habilidade que você deseja lhe traria um grande poder, no entanto, você será uma grande rainha com o poder já tem dentro de si.

-Está me dizendo que não vai me ensinar? Então a habilidade dos Kurayuki vai morrer com você? É isso? – muitas dúvidas passavam pela sua cabeça, provavelmente ela fez as piores perguntas que tinha em mente.

-É como sua mãe, nunca consegue fazer as perguntas certas em momentos desfavoráveis – Ele sorriu fraternalmente pra ela e afagou seu cabelo – há coisas que ainda não entende, em tudo deve haver equilíbrio – sua feição ficou mais séria e virou seu rosto para o horizonte – para uma grande força deve existir outra equivalente e oposta.

Ela olhava para seu pai, confusa, um turbilhão de pensamentos lhe enchia a mente. Sem saber o que realmente deveria perguntar, se calou, e por alguns minutos houve silencio.

-Seu filho – suspirou – você terá um filho, e ele aprenderá – e novamente fez-se silencio. Como ele podia saber do que estava por vir? Pensou ela – deve partir agora...

-Vem comigo?

-Não posso, eu morreria antes de cumprir meu propósito. E por falar nisso. Esse amuleto é uma arma, diferente dos outros dois. Ela saberá quando deve ser usada, e você saberá como.
Enquanto seu pai falava, Lara pegou com a mão esquerda o amuleto e ele se deformou. Era uma pedra irregular arredondada, e uma parte dele foi se estreitando, e alongando. Um material que nunca tinha visto na vida lhe escorria pelas mãos, azul e translúcido como água do mar e firme como vidro. Seus olhos se arregalaram. O punho da arma ganhava forma, a esfera que segurava agora tinha se tornado a guarda retorcida, enquanto o punho descia a mais de vinte centímetros, escurecendo em dégradé até se tornar preto na ponta.

-Está rápido demais – disse Aron – você deve partir agora! Não, não chegaria a tempo – a incerteza e as controvérsias confundiam Lara. Afinal, o que ela deveria fazer? E porque seu pai falava sobre coisas do futuro? Ele estaria louco? – não estou louco, se é o que quer saber – ela gelou por dentro. Acabou de ler meus pensamentos, pensou ela – Posso ler seus pensamentos tão claramente quanto você pode me ver. E também posso ver o futuro – suspirou – muito pouco, e não tão claramente quanto outros – Lara estava sem fala – agora você precisa se apressar. Aquele que chama de Enric tem algo a lhe contar, se ainda estiver vivo. Essa arma só deveria ser despertada em ultima instancia – ouviu-se um estalo agudo, o cabo da arma estava pronto, e a esfera trincou na outra extremidade.
Ela pegou pelo punho com as duas mãos e uma lamina saiu lentamente. Não parou de crescer até um metro. E a defesa também cresceu, era antes pouco menor que sua mão fechada, agora tinha três vezes esse tamanho, sem nenhum arranhão, ou sinal de deformidade.
Tão grande quando a força de sua alma, pensou ele. Aron proferiu algumas palavras em uma língua desconhecida e fez pequenos gestos com a mão esquerda, e de repente ela se viu num lugar devastado pelo fogo.

Havia um homem no chão rodeado de um liquido espesso e vermelho. Não se mexia.

-Enric! – gritou ela.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

O Reencontro de Anjos - ♛ Cαpítulo III - Parte II

Depois do pequeno diálogo chegamos à lanchonete, escolhemos alguma mesa vazia e nos sentamos à mesma. Olhamos no cardápio por alguns minutos, até optarmos os dois por uma simples xícara de café. A garota não me encarava, ficou olhando para o lado pela janela o tempo todo. De dentro era uma ótima paisagem, alguns casais passavam agarrados um no outro tentando afastar o frio, algumas crianças brincavam lançando bolas de neve uma na outra. Ela estava tão distraída que quando cutuquei a bochecha dela com um dedo indicador demorou alguns segundos para reagir e me olhar, claramente constrangida. O café havia chegado, mas nenhum de nós dois havia tocado neles, ao invés disso ela começou a mexer em sua bolsa, encarei-a até que de dentro da bolsa Kanade puxou um simples iPod e começou a falar enquanto desenrolava o fone de um jeito muito desastrado.

- Sabe, a música que está tão curioso por conhecer, o nome dela é Alchemy e o nome da banda que a interpreta é Girls Dead Monster.

- Mas como é possível? Eu não encontrei nenhuma informação sobre ela.

- Não me pergunte, essa é a única coisa que eu sei. Quando procurei nunca encontrei nenhuma pista de sua existência. Essa música apenas veio como uma faixa de demonstração é o que sei.

- Entendo. Então esse é um mistério sem solução para nós dois - ela assentiu com a cabeça.

Não pude negar minha frustração por não descobrir muito sobre aquela música, a sensação ao ouvi-la foi inexplicável, nostalgia, alegria e o mais importante: a atração. Era isso, a inegável atração que sentia pela garota a minha frente embalado pela música. Eu não me interessava por alguém assim desde o primário, e isso era ridículo era apenas a segunda vez que a via.

Levantei-me e em passos curtos me aproximei sentando ao seu lado, ela me encarou com um tom espantado em seu rosto e imediatamente levou a mão esquerda a ele cobrindo sua boca o que me fez checar se estava cheirando mal, ela se explicou.

- Sabe... Só por precaução, a primeira vez que chegou perto assim quase... - Enquanto ela falava seu rosto todo ficava avermelhado e ela voltava a olhar para janela ao lado antes mesmo de concluir seu pensamento.

-Oh... Sim, não era essa minha intenção desta vez, era só...

- Preciso ir, está ficando tarde meus pais estão me esperando para ajudar no preparo das comidas para a ceia de natal – Kanade me interrompeu e se levantou rapidamente.

- Tudo bem.

Acompanhei-a até a saída após pagar os cafés e já do lado de fora ficamos nos encarando por alguns minutos, não sabia o que falar e ela parecia saber menos ainda.

- Bem... Queria me desculpar por minha amiga hoje mais cedo, aquilo deve ter machucado.

- Sim machucou mesmo, na verdade até agora dói. Mas não se desculpe já que eu mereci aquilo - Dei um sorriso meio sem graça levando uma das minhas mãos a minha própria nuca.

Ela voltou a remexer em sua bolsa enquanto seus cabelos escorriam sobre seu rosto, seu tronco se inclinou um pouco para frente deixando por pouco tempo uma brecha entre seu corpo e casaco o que me deu a visão clara de uma parte da alça do sutiã dela, era rosa. Esgueirei-me um pouco para frente e percebi que o casaco escondia um volume nada mal por baixo de sua lingerie, achei mesmo que ela tinha menos de 14 anos? Mas, o que eu estava fazendo? Uma voadora novamente em minha cabeça seria algo totalmente merecido agora. A garota levantou o rosto e me encarou com a cabeça inclinada para o lado como um cachorro que não entende a ordem de seu dono.

- Hm...?

- Nada, não é nada - Me afastei bruscamente.

Tachibana finalmente puxou uma pequena agenda rosa bem simples da bolsa junto a uma caneta e começou a escrever alguma coisa. Após terminar destacou a folha e me entregou. Era um endereço.

- O q...?

- Minha casa. Não sei se tem algo melhor para fazer hoje, mas gostaria muito que passasse o natal comigo. Quero dizer, com minha família e amigos.
Pensei apenas por dez segundos. Sozinho em casa bebendo e comendo porcarias nada comparáveis a qualquer coisa que as famílias comem no natal.

- Eu irei.

- Fico feliz, estarei esperando.

E assim ambos tomamos o nosso caminho para casa. Estava animado, a quanto tempo não esperava tão ansiosamente pela noite de natal, pude perceber como eram bonitas as luzes piscando como de costume no natal, as pessoas sorriam á minha volta se preparavam e finalmente depois de tanto tempo eu também tinha meu motivo para sorrir nessa data.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

O Reencontro de Anjos - ♛ Cαpítulo III - Parte I

Quando cheguei a casa joguei as compras sobre o sofá e sentei no mesmo, levei minhas mãos a cabeça e passei alguns minutos encarando o teto tentando reorganizar as idéias. Em apenas uma manhã tantas coisas haviam acontecido, eu tentei beijar uma garota que nunca vi na vida, recebi uma voadora, tudo isso sumia da minha mente tão rápido quanto reaparecia. Mas o que mais me incomodava era aquela música que não parava de tocar em minha cabeça.

Depois de tomar um banho e trocar de roupa decidi pesquisar na internet sobre a música, conseguia me lembrar de um trecho dela, como era mesmo?

Mugen ni ikitai Mugen ni ikiraretara Subete kanau”

Sim, era isso mesmo. Mas foi nesse momento que comecei a ficar ainda mais incomodado. Simplesmente não aparecia nada, exatamente nada que levasse a uma música, era como se ela não existisse, mas como então aquela garota a estava ouvindo? Ela existia sim e eu iria descobrir tudo sobre ela.

Desci as escadas correndo com meu peito queimando de ansiedade, geralmente nada me provocava essa sensação e agora não conseguia explicar o porquê disso, mas mesmo assim, me vesti novamente com as mesmas roupas, luvas e gorro e saí de casa. Se nem a internet foi capaz de me ajudar a desvendar esse mistério só me restava buscar na maior loja de CDs da cidade que ficava no centro. De metrô não demorei muito a chegar lá, já eram 15 horas e logo ela iria fechar então me apressei. Falei com todos os funcionários cantarolei aquele trecho da música e tentei até reproduzir a melodia sem muito sucesso. Por fim consegui falar até com o dono da loja, era um senhor que no começo dizia conhecer todas as músicas e bandas possíveis, mas quando lhe perguntei nem mesmo ele soube me responder ou mesmo reconhecer a música, foi nesse momento que ouvi uma voz estranha atrás de mim.

- Desista, ninguém conhece essa música, é perda de tempo. - Falou Kanade.

Imediatamente me virei para ver quem era, e quando a reconheci foi como se tivesse levado um forte soco no estômago, meu ar foi roubado e meu coração batia tão forte que imaginei se todos a minha volta também não o escutavam.

- V...você é a garota de hoje, mais cedo. - Gaguejei sem conseguir ainda compreender a situação, havíamos nos encontrado de novo e agora ela falava comigo mesmo depois de eu ter tentado agarrá-la sem nem mesmo saber seu nome.

- Sim, você sai por ai tentando beijar qualquer garota distraída que encontra na rua? Seus hábitos são estranhos. - Ela tentou demonstrar irritação em sua fala, mas claramente não era boa em atuar, na verdade ela parecia mesmo curiosa.

- Realmente não, me desculpe por aquilo e...

- Não se explique, também não acho que aja explicação para isso, só tente se controlar, por favor. - Ela me interrompeu com tanta rispidez que cheguei a me assustar, mas antes de concluir a frase o tom de voz dela foi diminuindo como se faltasse certeza ou confiança no que falava.

- Sim, irei me controlar. Mas sobre a música, você a conhece?

- Conheço, mas creio que não possa te ajudar tanto.

- Mas você estava ouvindo-a mais cedo, qual o nome, compositor? Preciso saber.

- E posso saber o motivo de toda essa curiosidade?

- Bem... Na verdade nem eu sei, essa música me traz uma enorme sensação de nostalgia. Você pode me ajudar?

- Está bem, vamos conversar em outro lugar e te direi o que sei sobre ela.

- Ok, vamos.

A música saiu um pouco dos meus pensamentos e o que mais me interessava no momento era aquela garota que caminhava ao meu lado a uma lanchonete em um prédio ao lado. Ela não falou mais nada desde que saímos da loja de CDs e isso já estava me deixando um pouco nervoso. Mordia meu lábio inferior tentando afastar a tensão através da dor o que não adiantava muito, foi então que me lembrei de algo importante.

- Hm... Qual o seu nome?

Quando a perguntei ela sorriu levando uma das mãos até o rosto.

- Achei que nunca fosse perguntar, você é realmente estranho. Chamo-me Tachibana Kanade, prazer em conhecê-lo... É...

- Ah, sim. Chamo-me Yuzuru Otonashi, prazer em conhecê-la.